A Carta do Chefe Seattle

por | 17/10/08 | Espiritualidade, Sustentabilidade | 2 Comentários

 “O Que ocorrer com a Terra,
recairá sobre os filhos da Terra.
Há uma lição em tudo”
(Chefe Seattle)

Pobreza não é só falta de educação! Antes dos “educados” portugueses chegarem no Brasil, não existia pobreza. Os “primitivos” índios não eram miseráveis como são hoje, vivendo à margem de uma sociedade consumista mercantilista que não dá acesso a eles.

Geração de renda, valorização da cultura local são alguns componentes muito importantes para solucionar o problema da pobreza. Um grande exemplo de valorização da cultura nativa do continente americano é o da Carta do Chefe Seattle.

No ano de 1854, o presidente dos Estados Unidos Franklin Pierce fez a proposta de comprar grande parte das terras indígenas, oferecendo em troca, a concessão de uma outra “reserva”. Os índios Duwamish e Suquamish habitavam a região onde hoje se encontra o Estado americano de Washington, no extremo Noroeste dos Estados Unidos, divisa com o Canadá e claro, não queriam abandonar seu lar.

O texto da resposta do Grande Chefe Seattle, líder dos índios Duwamish e Suquamish, distribuído pelo programa da ONU para o Meio Ambiente, tem sido considerado como um dos mais belos e profundos pronunciamentos já feitos a respeito da natureza.

A Carta na íntegra

Como é que se pode comprar ou vender o céu, o calor da terra? Essa idéia nos parece estranha. Se não possuímos o frescor do ar e o brilho da água, como é possível comprá-los?

Cada pedaço desta terra é sagrado para o meu povo. Cada ramo brilhante de um pinheiro, cada punhado de areia das praias, a penumbra na floresta densa, cada clareira e inseto a zumbir são sagrados na memória e experiência do meu povo. A seiva que percorre o corpo das árvores carrega consigo as lembranças do homem vermelho.

Os mortos do homem branco esquecem sua terra de origem quando vão caminhar entre as estrelas. Nossos mortos jamais esquecem esta bela terra, pois ela é a mãe do homem vermelho. Somos parte da terra e ela faz parte de nós. As flores perfumadas são nossas irmãs; o cervo, o cavalo, a grande águia, são nossos irmãos. Os picos rochosos, os sucos úmidos nas campinas, o calor do corpo do potro, e o homem – todos pertencem a mesma família.

Portanto, quando o Grande Chefe em Washington manda dizer que deseja comprar nossa terra, pede muito de nós. O Grande Chefe diz que nos reservará um lugar onde possamos viver satisfeitos. Ele será nosso pai e nós seremos seus filhos. Portanto, nós vamos considerar sua oferta de comprar nossa terra.

Mas isso não será fácil. Esta terra é sagrada para nós. Essa água brilhante que escorre nos riachos e rios não é apenas água, mas o sangue de nossos antepassados. Se lhes vendermos a terra, vocês devem lembrar-se de que ela é sagrada, e devem ensinar as suas crianças que ela é sagrada e que cada reflexo nas águas límpidas dos lagos fala de acontecimentos e lembranças da vida do meu povo.

O murmúrio das águas é a voz dos meus ancestrais. Os rios são nossos irmãos, saciam nossa sede. Os rios carregam nossas canoas e alimentam nossas crianças. Se lhes vendermos nossa terra, vocês devem lembrar e ensinar a seus filhos que os rios são nossos irmãos, e seus também. E, portanto,vocês devem dar aos rios a bondade que dedicariam a qualquer irmão.

Sabemos que o homem branco não compreende nossos costumes. Uma porção de terra, para ele, tem o mesmo significado que qualquer outra, pois é um forasteiro que vem a noite e extrai da terra aquilo que necessita. A terra não é sua irmã, mas sua inimiga, e quando ele a conquista, prossegue seu caminho. Deixa pra trás os túmulos de seus antepassados e não se incomoda.

Rapta da terra aquilo que seria de seus filhos e não se importa. A sepultura de seu pai e os direitos de seus filhos são esquecidos. Trata sua mãe, a Terra, e seu irmão, o céu, como coisas que possam ser compradas, saqueadas, vendidas como carneiros ou enfeites coloridos. Seu apetite devorará a terra, deixando somente um deserto.

Eu não sei, nossos costumes são diferentes dos seus. A visão de suas cidades fere os olhos do homem vermelho. Talvez seja porque o homem vermelho é um selvagem e não compreenda.

Não há um lugar quieto nas cidades do homem branco. Nenhum lugar onde se possa ouvir o desabrochar de folhas a primavera ou o bater das asas de um inseto. Mas talvez seja porque eu sou um selvagem e não compreendo. O ruído parece somente insultar os ouvidos.

E o que resta da vida se um homem não pode ouvir um choro solitário de uma ave ou o debate dos sapos ao redor de uma lagoa, a noite? eu sou um homem vermelho e não compreendo. O índio prefere o suave murmúrio do vento encrespando a face do lago, e o próprio vento, limpo por uma chuva diurna ou perfumado pelos pinheiros.

O ar é precioso para o homem vermelho, pois todas as coisas compartilham o mesmo sopro – o animal, a árvore, o homem, todos compartilham o mesmo sopro. Parece que o homem branco não sente o ar que respira. Como um homem agonizante há vários dias, é insensível ao mau cheiro. Mas se vendermos nossa terra ao homem branco, ele deve lembrar que o ar é precioso para nós, que o ar compartilha seu espírito com toda vida que mantém.

O vento que deu a nosso avô seu primeiro inspirar também recebi seu último suspiro. Se lhes vendermos nossa terra, vocês devem mantê-la intacta e sagrada, como um lugar onde até mesmo o homem branco possa ir saborear o vento açucarado pelas flores dos prados.

Portanto, vamos meditar sobre sua oferta de comprar nossa terra. Se decidirmos aceitar, imporei uma condição: o homem branco deve tratar os animais desta terra como seus irmãos. Sou um selvagem é não compreendo qualquer outra forma de agir. Vi um milhar de búfalos apodrecendo na planície, abandonados pelo homem branco que os alvejou de um trem ao passar. Eu sou um selvagem e não compreendo como é que o fumegante cavalo de ferro pode ser mais importante que o búfalo, que sacrificamos somente para permanecer vivos.

O que é o homem sem os animais? Se todos os animais se fossem, o homem morreria de uma grande solidão de espírito. Pois o que ocorre com os animais, breve acontece com o homem. Há uma ligação em tudo.

Vocês devem ensinar as suas crianças que o solo a seus pés, é a cinza de nossos avós. Para que respeitem a terra, digam a seus filhos que ela foi enriquecida com as vidas de nosso povo. Ensinem as suas crianças, o que ensinamos as nossas, que a terra é nossa mãe. Tudo que acontecer a Terra, acontecerá aos seus filhos da Terra. Se os homens cospem no solo, estão cuspindo em si mesmos.

Isto sabemos: a terra não pertence ao homem; o homem pertence à Terra.

Isto sabemos: todas as coisas estão ligadas como o sangue que une uma família. Há uma ligação em tudo. O que ocorrer com a Terra recairá sobre os filhos da Terra. O homem não tramou o tecido da vida; ele é simplesmente um de seus fios. Tudo o que fizer ao tecido, fará a si mesmo.

Mas quando de sua desaparição, vocês brilharão intensamente, iluminados pela força do Deus que os trouxe a esta terra e por alguma razão especial lhes deu o domínio sobre a terra e sobre o homem vermelho. Este destino é um mistério para nós, pois não compreendemos que todos os búfalos sejam exterminados, os cavalos bravios sejam todos domados, os recantos secretos da floresta densa impregnados do cheiro de muitos homens, e a visão dos morros obstruída por fios que falam.

Onde está o arvoredo? Desapareceu.

Onde está a águia? Desapareceu.

É o final da vida e o início da sobrevivência.

Observação à respeito da autenticidade da carta
Existem muitas controvérsias sobre o conteúdo original do discurso. O primeiro registro escrito foi feito no Jornal Seattle Sunday Star em 1887 pelo Dr. Henry Smith, que estava presente no pronunciamento – ele publicou suas próprias anotações com comentários sobre o Grande Chefe, que segundo ele, era uma pessoa profundamente impressionante e carismática.
A versão que reproduzi aqui foi escrita por Ted Perry, em 1971, para um filme de temática ecológica chamado “Home”, lançado em 1972. Preferi essa versão por ser aquela que li pela primeira vez no Manual dos Magos da Terra (anexo ao Calendário Maia das 13 Luas de 28 dias – Calendário da Paz, ano Lua Planetária (2002-3), e que me emocionou e ainda me emociona muito. Não me importo que não tenha sido escrita por um índio, mas por um homem branco ecologista. Mas se você se importa, consulte:
ALLENSPACH, Natália. O Mito do Chefe Seattle. Recicle Blog: 2008.
ABRUZZI, W. S. The Myth of Chief Seattle. Human Ecology Review 7(1): 2000. P.72-75.
DEL PONT, R. M.  Lo que nunca dijo el jefe Seattle. Instituto Nacional de Ecología (México).
NOOIJ, A. The Chief Seattle Speech – An authentic indigenous american history or a symbolized fabulation?.Extended Essay / Lulea University of Technology: 2007.
Floresta Brasil – Grupo de Permacultura da UFPA
Site oficial da tribo Suquamish
Washington State Library

Imagens: Charles Frizzell. Copyright 1996 Isis Rising, Visionary Publishing, NPN Publishing, Inc.

#bad08

2 Comentários

  1. usuariocompulsivo

    Poxa Gabriel, desculpe pelo comentário sem conteúdo. Só para dizer que li e gostei 😉

    Há! Já sei o que comentar… O Agente Smith tem razão: “O ser humano é um vírus. Um câncer para este planeta…”

    []’s
    Compulsivo

    Responder
  2. Gabriel Dread

    Compulsivo!

    Não acho que o ser humano SEJA um vírus. Acho que o ser humano ESTÁ um vírus.
    Eu só rezo, espero, faço e me dedico para que este vírus tenha cura.
    Que bom que você gostou. Volte sempre!

    Abração

    Responder

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